DEUS E O BARBEIRO

- 09/03/2002 -

 

Encontrei esta estória em um recorde de jornal. Seu autor pretende provar a existência do deus em que acredita, com base na existência do barbeiro. Achei por bem fazer algumas considerações a respeito, em razão da diferença entre os dois.

 

“Um homem foi cortar o cabelo e a barba. Como sempre acontece, ele e o barbeiro ficaram conversando sobre várias coisas, até que – por causa de uma notícia de jornal sobre meninos abandonados – o barbeiro afirmou:
-
Como o senhor pode ver, esta tragédia mostra que Deus não existe.
-
Como?
- O senhor não lê jornais? Temos tanta gente sofrendo, crianças abandonadas, crimes de todo tipo. Se Deus existisse, não haveria sofrimento.
O cliente ficou pensando, mas o corte estava quase no final, e resolveu não prolongar a conversa. Voltaram a discutir temas mais amenos, o serviço foi terminado, o cliente pagou e saiu.
Entretanto, a primeira coisa que viu foi um mendigo, com barba de muitos dias, e longos cabelos desgrenhados. Imediatamente, voltou para a barbearia, e falou para a pessoa que o atendera:
-
Sabe de uma coisa? Os barbeiros não existem.
- Como não existem? – Insistiu o homem.

Porque se existissem, não haveria pessoas com barba tão grande, e cabelo tão desgrenhado como o que acabo de ver na esquina.
- Posso garantir que os barbeiros existem. Acontece que este homem nunca veio até aqui.
-
Exatamente! Então, para responder sua pergunta, Deus também existe. O que passa é que as pessoas não vão até Ele. Se o buscassem, seriam mais solidários, e não haveria tanta miséria.


Depois dessa estorinha, cujo autor pretendeu ter provado que o seu deus existe, seguiu uma estatística que aparece na internet:

“Se fosse possível reduzir a população do mundo inteiro em uma vila de cem pessoas, mantendo a proporção do povo existente agora no mundo, tal vila seria composta de:
57 asiáticos,
21 europeus,
14 americanos (Norte, Centro e Sul),
8 africanos;
52 seriam mulheres,
48 homens,
70 não brancos,
30 brancos,
89 seriam heterossexuais,
11 seriam homossexuais,
6 pessoas possuiriam 59% da riqueza do mundo,
8 viveriam em casas inabaláveis,
50 sofreriam de desnutrição,
1 teria computador,
1 (sim, apenas um) teria formação universitária.

Considere ainda: se você acordou hoje mais saudável que doente, você tem mais sorte que um milhão de pessoas que não verão a próxima semana.

Se nunca experimentou o perigo de uma batalha, a solidão de uma prisão, a agonia da tortura, a dor da fome, você tem mais sorte que 500 milhões de habitante no mundo.

Se você tem comida na geladeira, roupa no armário, um teto sobre sua cabeça, um lugar para dormir, considere-se mais rico que 75% dos habitantes deste mundo.

Se tiver dinheiro no banco, na carteira ou um trocado em alguma parte, considere-se entre os 9% das pessoas com a melhor qualidade de vida no mundo.

Após a leitura dos dois textos, pensei o no que devemos levar em consideração ao comparar o pobre barbeiro com o onipotente, onisciente, onipresente deus em que crêem a imensa maioria da população:  

 

Um barbeiro corta o cabelo daquele que o procura e paga por isso.

Mas o dito deus onipotente, justo, bom, etc., dele se disse:

Aquele que habita no esconderijo do Altíssimo, à sombra do Todo-Poderoso descansará. Direi do Senhor: Ele é o meu refúgio e a minha fortaleza, o meu Deus, em quem confio. Porque ele te livra do laço do passarinho, e da peste perniciosa. Ele te cobre com as suas penas, e debaixo das suas asas encontras refúgio; a sua verdade é escudo e broquel. Não temerás os terrores da noite, nem a seta que voe de dia, nem peste que anda na escuridão, nem mortandade que assole ao meio-dia. Mil poderão cair ao teu lado, e dez mil à tua direita; mas tu não serás atingido. Somente com os teus olhos contemplarás, e verás a recompensa dos ímpios. Porquanto fizeste do Senhor o teu refúgio, e do Altíssimo a tua habitação, nenhum mal te sucederá, nem praga alguma chegará à tua tenda. Porque aos seus anjos dará ordem a teu respeito, para te guardarem em todos os teus caminhos...” (Salmos, cap. 91).

 

No entanto, a esmagadora maioria dos que busca esse ou outro deus, com muita fé, estão entre os miseráveis sofredores, os paupérrimos. Não só pelo fato de a maioria da população ser composta desses, mas porque entre os miseráveis e os desprovidos de cultura há uma percentagem muito maior de religiosos do que entre os ricos e os bem informados. Há religiosos cultos, e deve existir analfabetos não religiosos, mas em muito menor fração.

 

Se os que buscassem o deus todo-poderoso fossem protegidos como está escrito no salmo 91, e como teria dito o crente ao tal barbeiro da estória, com certeza a hipotética vila de 100 pessoas teria mais de oitenta pessoas abastadas, felizes e sadias; porque, até o ano 2000, o número de ateus e não religiosos ainda não alcançou um bilhão dos seis bilhões de humanos, conforme estatística constante do Almanaque Abril/2001.

 

Mais atrocidades se tem cometido em nome de deus do que de qualquer outra coisas; as religiões continuam sendo a maior causa de guerras, e as catástrofes da natureza não escolhem entre bons e maus.

 

Levando-se em conta as limitações do barbeiro e a onipotência, a onisciência, a onipresença e a perfeição do Deus que se crê existir, nada em relação ao barbeiro pode provar a existência desse ser sobrenatural. Considerando-se os fatos e situações existentes, fica mais distante ainda a prova de que esse ou outro deus exista.

 

Ver PROVA DA INEXISTÊNCIA DE DEUS

 

Ver mais ARGUMENTAÇÕES INFUNDADES

 

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