DESCRIMINALIZAÇÃO DAS DROGAS EM PORTUGAL
15/02/2010
Descriminalização das drogas em Portugal - O retrato
factual
Manuel Pinto Coelho
Público, 27 Set 2009
Tem vindo a imprensa nacional e principalmente a
estrangeira, a referir com estranha insistência, em
vésperas de dois importantes processos eleitorais em
Portugal, o “retumbante sucesso” da descriminalização
das drogas, encetada em 2001 pelo governo socialista, à
revelia de todos os outros países europeus e em
detrimento das orientações e Convenções das Nações
Unidas de que o país é signatário.
O respeito pela verdade dos factos obriga a Associação
para um Portugal Livre de Drogas (APLD) a esclarecer os
portugueses sobre as verdadeiras consequências da
implantação da política actual, independentemente das
filiações partidárias. Portugal adoptou uma solução (?)
assaz original e inequivocamente questionável para gerir
o pesadelo das drogas.
Os artigos recentes do semanário britânico The Economist
e do Cato Institute de Washington promovem as opções
governamentais. É um direito legítimo, quiçá
politicamente correcto. O problema é o resto: a
manipulação arreliadora dos factos e dos números é
inaceitável…
1º - Em Portugal, no ano de 2006, o número total de
mortes por overdose não diminuiu radicalmente em relação
a 2000, nem a percentagem de toxicodependentes com sida
baixou (de 57% para 43%). Sucedeu o oposto. Assistimos a
uma preocupante degradação da situação. Os factos
demonstram isso mesmo: “Com 219 mortes de “overdose” por
ano, Portugal apresenta um dos piores resultados, com
uma morte a cada dois dias. Com a Grécia, Áustria e
Finlândia, é um dos países que registou um aumento de
mais de 30% em 2005” e “Portugal continua a ser o país
com maior incidência de sida relacionada com o consumo
de droga injectada (85 novos casos por milhão de
habitantes em 2005, quando a maioria não ultrapassa os
cinco casos) e o único que registou um aumento recente,
com 36 novos casos estimados por milhão de habitantes em
2005 quando em 2004 referia apenas 30” (Observatório
Europeu das Drogas e da Toxicodependência -OEDT - 2007).
Ainda segundo o relatório europeu, Portugal registou, em
2006, 703 novos casos de infecção, o que corresponde a
uma taxa oito vezes superior à média europeia!
2º - A descriminalização das drogas em Portugal não
permitiu de forma alguma a diminuição dos níveis de
consumo, pelo contrário. Na realidade, “o consumo de
droga em Portugal aumentou 4,2% - a percentagem de
pessoas que alguma vez na vida consumiram drogas passou
de 7,8% em 2001 para 12% em 2007, (IDT – Instituto da
Droga e da Toxicodependência português, 2008).
3º - No que se refere ao consumo de cocaína “os novos
dados (inquéritos de 2005-2007) confirmam a tendência
crescente registada no último ano em França, Irlanda,
Espanha, Reino Unido, Itália, Dinamarca e Portugal” (OEDT
2008). Enquanto as taxas de uso de cocaína e de
anfetaminas dobraram em Portugal, as apreensões desta
última droga aumentaram sete vezes entre 2001 e 2006, a
sexta mais elevada do mundo: (WDR – World Drug Report,
2009).
4º - No que diz respeito ao haxixe: - “É difícil avaliar
as tendências do consumo intensivo de cannabis na
Europa, mas, entre os países que participaram em ambos
os ensaios de campo, entre 2004 e 2007 (França, Espanha,
Irlanda, Grécia, Itália, Países Baixos, Portugal), houve
um aumento médio de aproximadamente 20%” (OEDT, 2008).
5º - Em Portugal, desde que a descriminalização foi
implementada, o número de homicídios relacionados com a
droga aumentou 40%. “Foi o único país europeu a
evidenciar um aumento significativo de homicídios entre
2001 e 2006” (WDR, 2009).
6º - Um relatório recentemente encomendado pelo IDT ao
Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (CESOP) da
Universidade Católica Portuguesa, baseado em entrevistas
directas, sobre as atitudes dos portugueses
relativamente à toxicodependência (que estranhamente
nunca foi divulgado), revela que 83,7% dos respondentes
considera que o número de toxicodependentes em Portugal
aumentou nos últimos quatro anos, 66,8% consideram que a
acessibilidade de drogas nos seus bairros foi fácil ou
muito fácil e 77,3% que o crime relacionado com a droga
aumentou ("Toxicodependências" nº 3 de 2007).
É esta é a pungente realidade portuguesa no que diz
respeito à droga e à toxicodependência.
Para o governo português, os toxicodependentes são
encarados essencialmente como doentes. É uma atitude
suicidária e dispendiosa para o erário público. Fingem
que estão doentes e o governo finge que os trata!
A descriminalização do consumo, da posse e da aquisição
para o consumo, penaliza apenas quando se adiciona outro
ilícito ao efeito do consumo, que funciona quase sempre
como atenuante. Legalizar o crime cometido por
“drogados” (ou por “doentes” - sic) não parece a forma
mais eficaz de o combater, como o atesta a invulgar taxa
de homicídios relacionados com droga registada em
Portugal em comparação com os outros países da Europa.
Facilitar o acesso à droga, não será o caminho para a
redução do consumo, a diminuição das toxicodependências
e da criminalidade associada.
É deveras curioso o que se passa em Portugal:
os toxicodependentes, com o apoio tácito do governo,
invocam a sua condição de “doentes” para não serem
punidos pelos seus delitos, mas depois esquecem-se que
são “doentes” e assumem-se como pessoas livres e
responsáveis, que decidem se se querem tratar ou não!
Ao considerar, pela via da descriminalização, o
toxicodependente um doente e não um delinquente, o
Estado não pode depois optar, através duma política que
dá a prioridade à “redução de danos”, por alimentar a
“doença” em vez de a curar!
Retumbante sucesso? Os resultados estão à vista!
Manuel Pinto Coelho,
Presidente da Associação para um Portugal Livre de
Drogas
<http://o-povo.blogspot.com/2009/09/descriminalizacao-das-drogas-em.html>
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