SÉRGIO MORO SEGUNDA VIA DE BOLSONARO

GUILHERME BOULOS
Confetes para Moro


A maneira despudorada como parte da mídia nacional tem incensado a candidatura de Sergio Moro revela que o establishment já escolheu seu candidato. Tudo o que setores do mercado financeiro e da direita tradicional brasileira desejam é um Bolsonaro civilizado e sem arroubos. Para eles, as políticas do governo Bolsonaro vão muito bem – a despeito de terem criado 19 milhões de famintos –, mas a figura do presidente causa constrangimentos todos os dias. Imaginem um Bolsonaro que use terno e não diga tantas baboseiras, eis o candidato ideal para a elite brasileira. Nas últimas semanas projetam euforicamente essa imagem no ex-juiz.


Moro, a rigor, não é nem mesmo uma terceira via. É a segunda via do bolsonarismo. Foi decisivo para a eleição do capitão, ao tirar Lula das eleições de 2018, tornando-se seu ministro. Entre outras atrocidades, defendeu o excludente de ilicitude para agentes de segurança que matam em serviço. Na condução da Operação Lava Jato, revelou-se tão autoritário quanto Bolsonaro e igualmente subserviente aos interesses do mercado. Seu alinhamento mais do que suspeito com o Departamento de Estado norte-americano também tranquiliza os entreguistas de plantão.

É incrível como, na cruzada para alçar Moro à condição de presidenciável, parte importante da mídia simplesmente apaga a história recente. Estamos falando de um juiz declarado parcial e suspeito pelo Supremo Tribunal Federal. De alguém que manchou a toga com compadrio espúrio com acusadores contra um réu e com o vazamento ilegal para a Rede Globo de uma conversa da então presidente da República, Dilma Rousseff, com um ex-presidente, Lula. De alguém que definiu absurdamente os destinos da última eleição presidencial. Praticamente se esquecem também de mencionar sua ligação umbilical com Bolsonaro, do qual se separou somente porque seus projetos de poder colidiram. É uma operação clássica de limpeza de imagem.


Mas há casos, como reconheceu ­Lady Macbeth, em que nem todos os perfumes da Arábia podem limpar uma mãozinha. Mesmo com propagandistas entusiasmados e com um bom fonoaudiólogo, Moro terá imensas dificuldades em firmar sua candidatura. De um lado, porque numa campanha eleitoral será confrontado a todo momento com a forma seletiva e ilegal como instrumentalizou o sentimento social de combate à corrupção. Terá de se explicar ainda pela hipocrisia de se filiar a um partido em que o secretário-geral foi preso por corrupção, na operação chamada de Mensalão do DEM. De outro lado, porque a ascensão de qualquer nome de direita para as eleições de 2022 depende do derretimento de Bolsonaro, tantas vezes anunciado, mas que não dá mostras de concretização.


Mesmo hoje, no pior momento de seu governo, com mais de 615 mil mortos nas costas, a volta da fome e da inflação e com a economia na lona, Bolsonaro se mantém na casa de 25% de apoio popular. É o suficiente para levá-lo ao segundo turno contra Lula. E no ano que vem ele ainda terá o Auxílio Brasil de 400 reais e dezenas de bilhões de reais do orçamento secreto, liberados pela aprovação da PEC dos Precatórios. A tendência é que, com isso, Bolsonaro recupere algum apoio entre os setores populares do eleitorado. Além disso, ele foi capaz de organizar uma sólida base ideológica de extrema-direita, que estará ao seu lado em qualquer circunstância. Essa base bolsonarista, que atendeu ao seu chamado no 7 de Setembro e que é extremamente ativa nas redes sociais e no WhatsApp, garante ao presidente um piso eleitoral considerável, estimado pelos institutos de pesquisa entre 10% e 15%.


De toda forma, acompanharemos nos próximos meses o espetáculo farsesco de elevação de Sergio Moro, mais uma vez, a herói nacional. Tentarão reeditar na sociedade o sentimento lavajatista e investir na ideia grotesca de que Lula e Bolsonaro são duas faces da mesma moeda. Venderão o ex-juiz de Maringá como estadista, com amplo conhecimento dos problemas do País. Moro, evidentemente, não tem roupa para essa festa, mas o desespero para forjar um candidato será grande. Está aberta a temporada de malabarismos e vergonha alheia dos porta-vozes da Faria Lima.


PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1187 DE CARTACAPITAL, EM 9 DE DEZEMBRO DE 2021.
 

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